domingo, 24 de abril de 2011

Capítulo 9 - Estrelas são estrelas


Trilha Sonora sugerida para o presente capítulo (Cap. 9 – Estrelas são estrelas):

Stars and Stars (Echo & The Bunnymen) 

http://www.youtube.com/watch?v=mD-6HMHLxzM

CAPÍTULO 9 – ESTRELAS SÃO ESTRELAS

Escrito entre: 08 de novembro de 2010
Período: 04 de novembro a 07 de novembro de 2010


            “E quanto à Vicky? O que eu faria se a encontrasse novamente? Não quero nem pensar nessa possibilidade... Ver a mesma com o seu noivo (na mesma circunstância que encontrei Marry) iria ser muito doloroso para mim. Não pretendo mais ver Vicky, pelo menos nessa vida...”.
            Pois bem, talvez eu tenha encontrado a resposta para esse “enigma”, já citado anteriormente. Qual a minha reação, caso eu visse Vicky mais uma vez? Pela minha atitude apresentada à situação (contrariando o que, antes, eu tinha concluído a respeito), acho que, talvez, esteja começando uma nova fase da minha vida... E, consequentemente, uma nova fase dos “Diários de Billy Winston”.
            Pode até ser que a garota não fosse Vicky, pois não tive tempo de observar com mais calma, já que eu estava dirigindo. Mas, sendo ela ou não, isso não faz a mínima diferença: o mais importante foi a minha reação ao avistamento, ou melhor, a minha frieza diante da garota que eu mais amei, no passado.  Contrariando as expectativas, não senti o menor desconforto ao presenciar Vicky naquela cena tão comum, apenas andando pela rua, despreocupadamente. Para falar a verdade, não senti nada, muito diferente de outros tempos. E acabei concluindo que não existe problema nenhum ao se apresentar o comportamento de uma pessoa fria, em momentos como esse. E aqui estou sugerindo a adoção de uma frieza “verdadeira”, e não de uma indiferença, só para manter o orgulho. Também não estou me referindo àquela “frieza mórbida” de um delinquente ou de um assassino (graças a Deus, isso não tem nada a ver comigo). Estou apenas apresentando o fato de não assumir um comportamento sentimental para qualquer coisinha tola do dia-a-dia e, no caso do exemplo citado, até mesmo inevitável: é claro que Vicky daria um rumo à sua vida, independente de meu amor por ela ser verdadeiro ou apenas uma paixão passageira. Ou seja, qual a vantagem de ficar me lamentando por algo inevitável? Acredito que o nosso sentimentalismo somente deve vir a tona em situações que nos tragam felicidade e não tristeza.
            Em todo caso, não posso simplesmente apagar o que senti por Vicky no passado, mas também não devo ficar sofrendo por causa dela, no presente. O lado bom de toda essa história foi o surgimento de uma das personagens mais queridas, engraçadas e carismáticas do livro “Jimball Bilangs”.


            Tarde de domingo, me encontro sentado em minha cama, com minhas pernas esticadas, uma posição realmente confortável. Meus cabelos compridos atingem boa parte dos meus olhos, dificultando um pouco a minha visão. Meu estômago está dolorido, visto que exagerei um pouco nos alimentos “fortes”, durante esse inesquecível fim de semana. No outro lado da minha cama, Melody (um dos meus gatos, a gatinha de pelagem negra) dorme tranquilamente e, quando me aproximo para acariciá-la, ela começa a ronronar. Logo acima de Melody, na estante, uma visão agradável: a estátua da menina loira, juntamente com a minha coleção de carrinhos em miniatura (incluindo os dois que ganhei de Cyrinda no dia anterior, data do meu aniversário, os quais adorei muito).
            Acabei de ler mais uma parte do livro “Tristessa”, de Jack Kerouac, escritor com quem me identifico muito. Quando comecei a escrever “Cicatrizar e Recomeçar” (no final de 2003), procurei não seguir o estilo de nenhum autor, adotando, assim, uma maneira própria de escrever. Quase 7 anos depois, descubro Kerouac, que escrevia de uma maneira muito parecida com o estilo que utilizo hoje.
            Apesar de tudo estar perfeitamente bem, acho estranho estar sentindo aquela “leve depressão” que surge de tempos em tempos (medo de alguma coisa que eu não sei ao certo o que é), ao mesmo tempo que sinto uma excitação ao observar a maneira “sensual” com a qual o meu corpo abrange quase a totalidade de minha cama. Que coisa! E eu que tinha afirmado (no presente livro) há pouco tempo atrás que não tinha “sex appeal” nenhum! Na verdade, estou começando achar que essa percepção de apelo sexual, talvez, varie de acordo com o nosso senso de humor e que todas as pessoas são sensuais. Cyrinda também havia escrito (em uma das inúmeras correspondências eletrônicas que trocamos) que também se achava desprovida de “sex appeal”. No entanto, depois que ela mudou o seu visual, alisando e arrumando o cabelo de uma maneira diferente (ficou muito linda), acho que essa minha querida amiga está sendo muito modesta ao dizer que também não tem o referido “sex appeal”.
            Bom, a lembrança da comemoração do meu aniversário, realizada no dia anterior, também se encontra “navegando” pela minha mente (juntamente com todo esse papo de “sex appeal”, de Jack Kerouac, de dores de estômago, de “depressões leves”), ao mesmo tempo que Melody permanece em seu “sono felino”. Sabe, meu aniversário de 35 anos foi um daqueles momentos mágicos, começando pelo lugar onde foi realizado: o novo apartamento de Carl e Bibi (ambiente muito agradável, assim como a casa de Eugene e Diane). Mesmo a comemoração sendo realizada na parte da noite, consegui imaginar a visão proporcionada por uma das janelas do apartamento, durante o dia (a qual Bibi e Cyrinda me relataram): uma enorme planície esverdeada, onde as vaquinhas comem grama, tranquilamente. Muito “Pink Floyd”! Vocês se lembram da capa do disco “Atom Heart Mother”?
            Bom, quanto aos amigos presentes no aniversário (Eugene, Diane, Cyrinda, Carl e Bibi), acho que não existe a necessidade de colocar aqui, nesse relato (pois já é de conhecimento de todos) o quanto eu adoro cada um deles. Inclusive, “A amizade”, título de um dos poemas pertencentes ao meu livro “Sentimento e Insensatez”, está se referindo a esses queridos amigos (nova geração) e, também, aos antigos (velha geração). Curiosidade: o poema citado foi escrito em 2009 e teve, como inspiração, aquela festa de aniversário (surpresa) que eles realizaram para mim, na casa da família de Bibi (outro momento inesquecível). E pensar que, no início do século 21, eu caminhava sozinho pelas ruas e não tinha ninguém... Vou recapitular essa época (triste) de minha vida com mais calma.
            Entre 2001 e 2002, os meus amigos antigos ou tinham se casado, ou tinham se mudado do Grass Valley ou estavam andando com outros amigos. Em 2001, somente eu e Micky ainda estávamos tentando formar bandas e saindo para curtir a noite. No entanto, chegou a época em que Micky teve que tomar o seu caminho (agora não me lembro se ele partiu para Curitiba ou para Joinville). Felizmente, em meados de 2002, ele retornou ao Grass Valley e, com muita dificuldade, formamos a banda “Soma”. Naquela época, Micky já não era somente meu amigo ou, simplesmente, o guitarrista solo da minha banda: mais que isso, ele estava se tornando o meu irmão (e também o irmão de Hal, nosso amigo vocalista). Infelizmente, durante todo esse clima de fraternidade, amizade e criatividade musical, Micky teve que ir embora mais uma vez. E eu acabei mergulhando em uma verdadeira confusão mental: meu melhor amigo havia partido, agora eu não tinha mais ninguém.  Mais detalhes a respeito desses episódios em “Cicatrizar e Recomeçar”.
            Mas, em 2003, tudo iria mudar... Os meus laços de amizade com os integrantes da minha banda mais nova (a “Máfia de Memphis”) estavam se tornando cada vez mais fortes, a medida que novos amigos iam se juntando à nossa “sociedade microcósmica” (termo que eu e Dezones, outro amigo que considero um irmão, usávamos para definir o nosso grupo, durante o cursinho pré-vestibular). Com a mudança de classe, no próprio cursinho (mudança já relatada em capítulos anteriores), a “sociedade microcósmica” se transformou em “sociedade macrocósmica” (ou seja, um grupo de amigos muito maior) e vieram, então, Cyrinda, Bibi, Diane, entre outros. Posteriormente, Bibi trouxe Carl e Diane trouxe Eugene. Mais tarde, boa parte dos amigos pertencentes à “sociedade macrocósmica” tiveram que tomar o seu caminho. Mas, felizmente, Carl, Bibi, Cyrinda, Diane, Eugene e Dezones permanecem comigo até os dias de hoje. Então, posso dizer, com orgulho, que jamais serei, novamente, um “solitário a caminhar pela cidade antiga”... Que alívio! E pensar na solidão do início do século 21... Nossa, doía demais!
            Para terminar todo o assunto (enquanto ainda permaneço em estado de relaxamento, deitado aqui em minha cama), sei que vai ser inevitável o seguinte questionamento, a respeito do presente livro: “Ei Billy, eu também sou seu amigo: então, porque eu apareço tão pouco nos ‘Diários de Billy Winton’? Ao contrário de Cyrinda, Dezones, Eugene, Diane, Bibi e Carl, que aparecem em quase todos os capítulos?”.  Ora essa, se você sumir, eu não tenho culpa da sua modesta participação na narrativa! Apareça em sonhos, pelo menos...

domingo, 17 de abril de 2011

Capítulo 8 - Labuta


Trilha Sonora sugerida para o presente capítulo (Cap. 8 – Labuta):

Sunday Morning  (The Velvet Underground & Nico) 

http://www.youtube.com/watch?v=eF_CQGHqzts

CAPÍTULO 8 – LABUTA

Escrito entre: 27 de outubro de 2010
Período: 24 de outubro de 2010



            No domingo, acordei cedo, extremamente cansado por causa da festa de casamento da noite anterior. Ainda me encontrava confuso, também, por causa das lembranças e situações referentes à comemoração. Então aproveitei para colocar todas as emoções no papel (ou melhor, no computador), conforme foi visto no capítulo anterior. Depois, me dirigi ao posto de gasolina perto de casa, na sua respectiva lojinha de conveniência, para comprar o jornal de domingo. Acabei vendo o senhor Martião durante o caminho, e outras lembranças vieram à minha mente.
            O senhor Martião é pai de Lisa (polêmica personagem de “Cicatrizar e Recomeçar” e “Jimball Bilangs”). Das amigas mais íntimas que tive, acredito que Lisa é a única com quem eu não tenha “relações diplomáticas”, atualmente. No passado, ela teve vários problemas com Pam, Adam Ball, Sandy e, depois, acabou tendo problemas comigo também (mais detalhes a respeito do assunto podem ser encontrados nos meus dois livros, já citados). Mas acho que ela, no fundo, não tem raiva de mim (vide, mais uma vez, o assunto no livro “Cicatrizar e Recomeçar”). E eu, também, jamais poderia guardar mágoa da única garota da face da Terra que me amou, que me mandou bilhetinhos com palavras de amor, que chorou por mim e que até mesmo me “incomodou” com seus inúmeros telefonemas (confesso que, hoje, eu sinto saudade desse incômodo). Enquanto Pam sentia atração por mim, Lisa sentia amor. Ambas colocaram em prática os respectivos conceitos (atração e amor) e me provaram a impossibilidade da união dos dois.
            Comprei o jornal no posto e, quando estava indo embora, aquela linda menina morena que trabalha por lá (uma das meninas mais lindas que já vi na minha vida), me cumprimentou com um simpático e tímido “oi”. Fiquei feliz com a gentileza dela e retribuí o cumprimento da mesma maneira. No entanto, como eu estava um pouco mal-humorado, foi inevitável aquele pensamento: “Apesar de eu ser muito simpático, ela me cumprimentou apenas pelo fato de eu ser um mero cliente do posto,”. Mas, depois, acabei imaginando que a garota, por sua vez, até pudesse ter pensando: “Esse menino é simpático comigo, mas não faz diferença, pois ele é simpático com todas as funcionárias existentes por aqui”.
            E assim eu vou divagando por esse mundo afora, ao mesmo tempo que procuro (pelo menos por alguns instantes) desligar a minha mente para relaxar um pouco, mas sem nunca conseguir realizar tal proeza. A minha mente é como se fosse uma fábrica dos tempos da Revolução Industrial, que me atormenta 24 horas por dia com a sua terrível labuta (não me dá sossego nem quando eu adormeço, com seus sonhos e pesadelos). Mas confesso que, dependendo da época, qualquer pesadelo é muito melhor do que a realidade.

Fim da primeira parte - Considerações Gerais

            E aqui termina, de forma (ainda) melancólica, a primeira parte do livro “Diários de Billy Winston”. Surpreendido com o resultado positivo que esse blog obteve em menos de um mês (mais de 400 visitas) e, o melhor, com a identificação e empatia que os visitantes obtiveram a partir da leitura do mesmo, acho necessário tecer algumas considerações, antes de partirmos para a segunda (e melhor) parte do livro.
            Acredito que a receptividade que o livro recebeu é resultado da maneira utilizada, por mim, para expressar meus sentimentos, ou seja, sem rodeios e falsidades. Não posso simplesmente ser falso comigo mesmo e ocultar a realidade. Assim procedendo, coloco no papel aquilo que eu estou sentindo e, o mais interessante, muitas vezes consigo expressar aquele tipo de sofrimento “universal” que grande parte das pessoas já enfrentaram ou ainda estão para enfrentar, no decorrer dessa vida. Hermann Melville afirma, em seu livro “Moby Dick”, que o homem “100% feliz” não existe. Assim sendo, todo mundo já se lamentou por algum problema de difícil solução, já ficou triste por uma crítica não construtiva ou se revoltou por uma injustiça praticada.      Um grande amigo, chamado Felipe, nos brindou com um excelente comentário a respeito do Capítulo 3 (O fogo), nos indicando um dos livros da Bíblia que ele mais gosta, o livro sapiencial de “Jó”. A partir da leitura do mesmo, pude perceber que Jó, logo no início da narrativa, lamenta a sua condição de desgraça, questionando corajosamente a sua situação e, o mais impressionante, mostrando que tem sérios motivos para reclamar. Considero e me identifico com esse tipo de sinceridade, onde percebemos a importância de desabafar o que estamos sentindo, ao invés de ficar guardando ressentimentos que, por sua vez, só tendem a piorar a nossa sanidade, a medida que o tempo passa. Assim sendo (para a felicidade da maioria dos meus queridos leitores), não vou mudar o meu estilo sincero de escrever, ou seja, sempre estarei a denunciar e a lamentar o que eu não considero correto, sem rodeios ou tentativas hipócritas de “enfeitar a realidade”. Fazendo uma exagerada comparação, “Diários de Billy Winston” está mais para uma “Tragédia”. Assim, caso alguém não aprecie o referido estilo, que procure então as “Epopeias” e fique sonhando com um mundo perfeito: não é motivo de vergonha para ninguém, pois eu mesmo já sonhei com um mundo perfeito (antes de desenvolver uma maneira crítica de encarar a realidade).
            Falando, agora, a respeito da segunda parte da narrativa, que constituirão as próximas postagens do Blog, a situação mudará radicalmente, com a participação de uma nova personagem, chamada “Frieza Benigna”. Na verdade, não se trata de uma personagem, e sim de um sentimento (que, pela sua intensidade e importância na história, não é nenhum exagero chamá-lo de personagem). Todos os acontecimentos desagradáveis, mostrados na primeira parte do livro, geraram um tipo reflexão e, posteriormente, uma visão mais crítica a respeito da vida e das próprias relações entre os seres humanos. “Tudo é vaidade”, conforme nos mostra o livro do “Eclesiastes”: “tudo é fugaz, uma corrida contra o vento”. Mas darei mais detalhes, a respeito desse assunto, durante a própria narrativa, sempre de “mãos dadas com a Frieza Benigna”. Grande abraço a todos! E bom divertimento!

domingo, 10 de abril de 2011

Capítulo 7 - O Casamento

Trilha Sonora sugerida para o presente capítulo (Cap. 7 – O Casamento)

Get Over You (The Undertones) 

http://www.youtube.com/watch?v=4PbRr2XHs9s

CAPÍTULO 7 – O CASAMENTO
           
Escrito entre: 24 de outubro de 2010
Período: 23 de outubro de 2010


            Finalmente chegou o dia do matrimônio de Carl e Bibi. Tirei a sexta (dia anterior ao evento) e o sábado (dia do evento) para descansar, arrumar minha roupa, enfim, me dedicar exclusivamente para o casamento dos meus queridos amigos.
            Mas, na sexta, na parte da noite, tive tempo de passar na casa de Dezones e lhe entregar o presente livro (até onde o mesmo havia sido escrito, ou seja, tudo menos o atual capítulo, que estou escrevendo agora). Dezones gostou do livro, se emocionou em várias partes e até grifou algumas frases legais, para poder refletir sobre as mesmas com mais calma, posteriormente. Achou o livro bastante leve e filosófico, também. Depois, aproveitou para me contar que ele e Burt Caldwell (outro grande amigo nosso) conheceram uma garota (durante o retorno da viagem, referente ao show da banda “Los Hermanos”) que toca violão e também gosta de gaita. Preciso conhecer essa menina!
            E no sábado, ao adentrar na igreja (juntamente com Cyrinda) para prestigiar o casamento, foi inevitável aquela percepção, a qual eu e Dezones comentamos certa vez: “Esse tipo de felicidade (casamento) parece não ter sido feito para nós, os verdadeiros marginalizados do amor”. Mais ou menos aquela ideia citada por Álvarez de Azevedo, em um dos seus poemas mais célebres: “Só tu à mocidade sonhadora / Do pálido poeta deste flores... / Se viveu, foi por ti! e de esperança / De na vida gozar de teus amores.”. Ah, a mocidade! Como a mocidade me foi cruel! Lá se vai aquela bela percepção dos tempos de infância: carrões, rock e uma bela garota me amando! Atualmente, tanto a agressividade como amabilidade não fazem a menor diferença: não sei qual das duas é a mais inútil para se conquistar uma mulher... E o desejo pelo amor se resumindo naquela (sempre presente) melancólica utopia, que por sua vez é provada na prática, ao me “jogar na cara” que sou, na verdade, a incompetência ambulante dos relacionamentos: a criatura sem “sex appeal”, sem corpo definido, morto de desejo por uma massa corporal maior (e consequentemente, por dias melhores), com um cabelo que é apenas lindo quando estou no interior do meu lar (e que se desmancha justamente quando boto o meu pé para fora de casa). E lá se vão, também, os meus anos de paixão por Vicky e Pam, as prováveis chances desperdiçadas: tempos onde parecia não existir a necessidade de possuir um corpo de “deus grego” para poder agarrar alguma menina ou uma tatuagem para contaminar a minha pele ou alguns “piercings” para me deixar repleto de buracos (fora os que eu já tenho por natureza, incluindo esse buraco dentro da minha própria alma).
            Todas essas sensações, apresentadas até aqui, parecem se tratar de uma grande lamentação de minha parte. Mas, na verdade, não é: basta recordar o que foi escrito no início do parágrafo anterior, onde digo “E no sábado, ao adentrar na igreja (juntamente com Cyrinda) para prestigiar o casamento, foi inevitável aquela percepção...”. Ou seja, mesmo consciente desses pormenores da minha vida errante, foi apenas uma percepção, uma lembrança desagradável. Na verdade, eu estava me sentindo muito bem durante a cerimônia, orgulhoso pela felicidade de Carl e Bibi, já que adoro os dois e tenho certeza que ambos também gostam muito de mim.
            A festa de casamento também foi maravilhosa, com poucos momentos de desconforto. Pude rever amigos e amigas que não vejo com tanta frequência: Tim (irmão de Diane), Vince (primo de Bibi), Diana Lee, Melanie, Lucky (noivo de Melanie, muito legal, com quem pude conversar pela primeira vez), Felícia Mendel, Felícia Nelly, Cilla (juntamente com sua filha), Julie, entre outros. Foi divertido, inclusive foram registradas várias fotos desse encontro histórico. Mas confesso que me senti incomodado apenas uma vez: quando a aparência (e o vestido) de uma garota (que não sei ao certo quem é) foi colocada em julgamento, sem dispensar as baixarias e palavras de baixo calão. Não sei por que esse tipo de atitude ainda me causa tanta dor. Talvez seja pelo fato de, algumas vezes, eu já ter sido a vítima (em uma intensidade menor) ou, quem sabe, pelo sentimento doloroso de imaginar as autoras das críticas me “rechaçando” da mesma maneira (pelas costas), ao criticar a minha aparência (será que eu estava bem de terno?). Mas sem ressentimentos: ao contrário de outros eventos (onde eu sempre me perguntava “Quem será que vai me magoar dessa vez?”), fico feliz de ninguém ter me deixado triste durante a comemoração. Assim, posso dizer que o casamento de Carl e Bibi vai ficar registrado, na minha mente, como uma das ocasiões mais felizes de minha vida.
            Agora, vamos às novidades: novas experiências, novas visões de mundo, novos “satoris” (ou iluminações súbitas). Num determinado momento, o Dj anunciou, através do som, que havia chegado a hora das danças e, da mesma forma que fiz no casamento de Eugene e Diane (outro evento maravilhoso, diga-se de passagem), resolvi ficar contemplando toda a festividade (pois não gosto muito de dançar, não me sinto muito bem). E, ao contrário de outras festas, não me senti atraído por nenhuma garota (apesar de muitas solteiras estarem por ali): uma espécie de interrupção súbita de libido (quem sabe, seja este o referido “satori”?). Acredito que nem mesmo Vicky, naquele momento, poderia quebrar esta “crise celibatária” e me trazer algum tipo de prazer. Resumindo, eu estava me sentindo muito bem: não amar e não sentir prazer é chave de toda a minha liberdade. E, também, é o momento certo para se investir em alguma garota (!?). Como assim? É muito fácil explicar essa situação, comparando-a com o meu ingresso na faculdade. Nos três anos em que fiz o curso pré-vestibular (e nos quais eu estudei muito), aquela ideia de “Meu Deus, investi uma nota no cursinho, preciso passar no vestibular de qualquer jeito” acabou fazendo com que eu ficasse muito mais nervoso durante a prova (e, consequentemente, tomasse “bomba”). Já aquele ano posterior, onde não fiz o cursinho (e estudei muito pouco), foi justamente o ano em que passei no vestibular, pois estava muito mais tranquilo (já que não tinha feito nenhum investimento para poder passar na prova, ou seja, o curso). Pensando dessa maneira, para mim é muito mais fácil tentar algo com uma garota quando eu não estou “transbordando” de paixão (em um estado de tranquilidade), ao invés de tomar alguma atitude quando estou apaixonado (em um estado de ansiedade). O que vou narrar a seguir, a respeito da minha modesta “empreitada”, talvez não signifique nada para alguém já experiente em relacionamentos. No entanto, para mim (a incompetência ambulante dos relacionamentos), foi um grande passo, já que nunca havia me comportado daquela maneira (pois sou muito tímido).
            Era uma garota muito bonita e, apesar de não ser o meu tipo, tenho certeza que era uma garota de espírito superior (devido a sua nobre ocupação, que não pretendo revelar aqui). Comecei a olhar para ela diretamente, sem tirar os meus olhos por um segundo sequer: se ela se sentava, eu olhava em direção à sua mesa; se ela dançava, eu dirigia o olhar para a pista de dança. Ela ficou muito encabulada, principalmente quando estava dançando, ao substituir a naturalidade dos movimentos de seu corpo por uma postura mais contida. Comecei ficar com pena dela, pois é difícil me afastar daquele pensamento que sempre carrego comigo, do tipo “amar é ofender”. Ou seja, como nunca consegui nada com as garotas que eu amei, adquiri esse trauma absurdo. A minha mente até entende que eu tenho o mesmo direito de amar como qualquer outra pessoa. No entanto, ainda carrego comigo aquele pensamento “Como você ousa me amar, seu ‘serzinho’ inferior?”, ao imaginar o que a garota em questão, talvez, esteja pensando ao meu respeito. Até comentei com tio Ned (pai de Diane e Tim) que estava com pena, pois a menina estava ficando muito encabulada, e ele me disse, com seu bom humor, algo do tipo: “Não tenha pena!!!”.
            Infelizmente, tive a certeza de que tudo aquilo ficaria só na troca de olhares, pois não foi difícil de perceber que a garota era tão tímida quanto eu. E, conforme a tradição, é sempre o homem quem precisa “chegar” na mulher, de forma que nem cogitei tal atitude (talvez seja por isso que eu abomino as tradições, como o arroz e as gravatas). Tio Ned, antes de ir embora, me disse que lamentava muito pelo fato das coisas não terem dado certo para mim, referentes àquela linda garota (que não lhe revelei quem era). Mas fiquei feliz com a minha modesta atitude em tentar alguma coisa: é bem melhor seguir essa vertente do “passo a passo” ao conquistar uma mulher do que aquela outra, onde algum amigo “arranja” alguém para você (independente de você se sentir atraído por aquela pessoa ou não). Mas, devo citar, aqui, outro grande motivo para toda essa minha dificuldade em “chegar” na garota: o fato de Pam (minha grande amiga do passado) ter me deixado muito mal acostumado, já que eu nunca precisei “chegar” nela (a própria Pam chegava me agarrando). Bons tempos!
            Quando a festa finalmente chegou ao fim, dei um abraço em Carl e Bibi, me despedi do pessoal e finalmente me dirigi para minha casa. E acabou sendo inevitável a lembrança do meu finado amigo Bret, por dois motivos: o primeiro, pelo fato de sua prima Naty (também minha amiga das antigas, dos tempos da “galera do Grass Valley”) estar presente na comemoração; o segundo, devido algumas músicas dos anos 50 que tocaram na festa, as quais Bret adorava (“Jive Bunny and Mastermixers” e “La Bamba”). Quando cheguei em casa, essa lembrança me deixou muito confuso e desnorteado: pedi a Deus para colocar um pouco de juízo na minha cabeça e me fazer entender, de uma vez por todas, que a morte é algo natural e vem para todos. Mas nada dessa ideia entrar na minha mente, e acabei chorando muito, antes de dormir. Bem patético de minha parte, infelizmente.
            Bret foi o primeiro amigo meu que partiu para a eternidade. Ele faleceu em 2003, justamente no dia do segundo “Mega evento”, realizado na casa de minha amiga Louise. Foi uma espécie de estreia da Máfia de Memphis (apesar de Caleb e Burt estarem ausentes). Naquela noite, de coração partido, toquei “Basket Case”, em homenagem a Bret, enquanto pensava: “por que você teve que ir embora tão cedo, meu amigo? Eu, assim como todo mundo, adorava você!”. Depois de alguns dias, eu viajei para Curitiba e, em uma das noites, Bret apareceu para mim em um sonho, onde me deu um grande abraço, como quem estivesse dizendo: “Também gosto muito de você Billy, fica com Deus! E vê se não demora muito!”. Sinto muito Bret, mas acho que pretendo permanecer mais algum tempo aqui no planeta Terra: é muito doloroso pensar na ideia de morrer e abandonar Carl, Bibi, Cyrinda, Diane, Eugene, Dezones, enfim, todos os meus amigos. Ah, acho que agora comecei a entender o porquê de esquecermos, com frequência, o fato dessa vida não ser a definitiva... Talvez seja mais algum “satori” transmitido por Bret, já que o meu amigo era Budista.

PRÓXIMA POSTAGEM: O Último Capítulo (Primeira Fase) de “Diários de Billy Winston”.

terça-feira, 5 de abril de 2011

Capítulo 6 - Máfia de Memphis: vivendo (e morrendo)


Trilha Sonora sugerida para o presente capítulo (Cap. 6 – Máfia de Memphis: Vivendo (E morrendo)

Somethin’ Else (Eddie Cochran) 

http://www.youtube.com/watch?v=mgQg4ze1_KU

CAPÍTULO 6 – MÁFIA DE MEMPHIS: VIVENDO (E MORRENDO)
           
Escrito entre: 03 de outubro de 2010
Período: 09 de outubro a 13 de outubro de 2010



            Faltam exatamente duas semanas para o casamento de Carl e Bibi.
          Nesse sábado, terminei de ler o livro “Big Sur”, de Jack Kerouac. Bem diferente do “On the Road”, “Big Sur” relata a experiência de Jack com as bebidas, incluindo as graves consequências desse vício (dores, alucinações, depressão, paranoia, ansiedade, etc). Apesar de não ter tido (grandes) problemas com as bebidas no passado, eu meio que me vi na pele de Jack durante a sua narrativa. A única diferença foi que, ao invés da bebida, o meu grande problema, no passado, consistiu nos antidepressivos, os quais eu tomava para (tentar) conter as minhas graves crises de ansiedade. E foi em uma festa surpresa para Bibi, em 2004, que senti todos os sintomas do meu problema da pior forma possível.
            O contexto daquela época se resumia no seguinte: eu conduzindo a minha banda (“Máfia de Memphis”) e me enturmando cada vez mais com os “punks” (“apelido” da nossa turma), ao mesmo tempo que trocava uns e-mails “secretos” com Cyrinda. Ah, tinha também o Dezones e a loirinha Diana Lee trocando farpas (o que era muito engraçado). O meu estado de saúde, aos olhos de todos, parecia ser normal. Mas, na verdade, eu estava apenas disfarçando: só Deus sabe o que eu passei, naquela época.
            Mas tudo começou a se agravar alguns dias antes de eu conhecer Cyrinda, Bibi, Diane, Diana Lee, enfim, toda a turma no cursinho pré-vestibular de 2003 (e o fato de conhecer elas foi um alívio, no meio de tanta dor). Até aquele momento, a minha crise de ansiedade estava centrada totalmente no meu estômago, ou seja, bastava maneirar na comida e tudo bem. O agravante foi quando a doença começou a atingir o meu lado psicológico de maneira mais incisiva (na verdade, as dores de estômago também eram causadas pelo meu lado psicológico, mas não passava de uma brincadeira perto de tudo o que aconteceria, a partir de então).
            Dezones e Ralph haviam mudado de classe, durante o curso pré-vestibular e, depois de alguns dias (por causa da insistência dos dois), resolvi me juntar a eles. Acredito que o início do meu drama (detalhado no meu livro “Cicatrizar e Recomeçar”) tenha ocorrido logo no meu primeiro dia, na nova classe, onde eu acabei tendo uma visão. Finalmente, depois de quase 10 anos, o grande amor da minha vida havia voltado para me atormentar: Vicky. Quando trocamos nossos olhares pela primeira vez, naquela nova classe, tive a certeza que realmente amava aquela garota: o fenômeno do amor à primeira vista (o qual eu não acreditava) acabou acontecendo comigo. Depois que esse breve devaneio passou e voltei à realidade, descobri que não se tratava de Vicky, mas sim de uma garota muito parecida com ela, chamada Jenny. Um verdadeiro clone! Acabei ficando amigo dela. Mas, infelizmente, o amor (ou ficção dentro da realidade) que eu sentia por ela, como sempre, não foi correspondido. E minha ansiedade se agravou, de modo que eu não conseguia assistir as aulas sem carregar comigo os meus calmantes. Depois de alguns dias, como já relatei, fiquei muito amigo de Cyrinda, Bibi, Diane, Diana Lee e essa amizade com as minhas novas amigas até que melhorou um pouco a minha sanidade.
            Bom, o curso pré-vestibular de 2003 terminou e, finalmente, em 2004, chegamos à época do aniversário de Bibi. Ajudei Carl e Cyrinda na organização da festa surpresa. Primeiramente, arrecadamos todo o dinheiro e fizemos as compras. O próximo passo foi deixar a minha bateria, escondida, na casa de Diane, uns dias antes da festa. O último passo foi me apresentar com a “Máfia de Memphis” no aniversário, onde acabei falhando comigo mesmo, devido a vários fatores (tirando a minha ansiedade natural em tocar em público).
            Cyrinda havia me pedido para levar a minha prima (Nina) para participar da festa. Lembro de dizer à Cyrinda “Claro, sem problemas”, mas, na verdade eu pensava comigo mesmo “Tô f..., a Nina vai aprontar, vai beber todas as bebidas alcoólicas da festa, vai dar vexame... Meu Deus! Minha tia Nancy (mãe de Nina) nunca vai me perdoar! Bibi e Carl vão ficar com raiva de mim!”. Mas não quis magoar Cyrinda e, depois de colocar parte dos instrumentos no carro (guitarra, microfones, caixas de som), apanhei Nina em sua casa e parti para a casa de Bibi. Ou seja, não me esqueci de levar nada (incluindo a minha querida e polêmica prima), exceto algo imprescindível para o sucesso da minha apresentação com a “Máfia”, resumida nas palavras desesperadas, ditas por mim, ao telefone, depois de ter chegado à casa de Bibi: “Dezones, pelo amor de Deus, esqueci os meus calmantes, antes de você sair da sua casa pega eles para mim com a minha mãe”, ao mesmo tempo em que pensava comigo mesmo “A Jenny já está aqui, mais sarcástica do que nunca...  E se ela se engraçar com o Caleb (baixista da Máfia)? Eu tô com medo, eu não vou suportar”. Dezones fez o que eu pedi. No entanto, quando ele chegou à casa de Bibi e me disse, com o seu sotaque inconfundível “Todo o roqueiro precisa de drogas para tocar”, me entregando os calmantes, já era tarde demais: meu estômago já estava todo “arrebentado”, os calafrios atingiam todo o meu corpo e meu amor por Jenny estava prestes a explodir como uma bomba (que destruiria eu mesmo, e depois toda a festa). Ah, e se a Nina ficasse bêbada, ainda por cima? E se o Caleb desse em cima de Jenny? E se eu desmaiasse durante a apresentação? “Carl, pelo amor de Deus, tem papel higiênico no banheiro?”. “Burt, acho melhor deixar um saquinho aqui perto da caixa de som, caso precise vomitar!”. “Aaron, isso não pode ser verdade: você trouxe alguém para filmar a festa? Vai filmar toda a minha desgraça?”. “Andrew, pára de me lembrar que eu sou magro e vai arrumar a bateria, p...!”. Para mim, tudo se resumia numa tremenda confusão, onde os calmantes “incompetentes” quase não surtiram efeito nenhum, após eu utilizá-los.
            Finalmente, Bibi chegou e aconteceu toda aquela comoção que uma festa surpresa proporciona. Surpreendentemente, acabei fazendo um bom trabalho como ator, disfarçando os sintomas da minha doença e desenvolvendo uma boa apresentação com a “Máfia de Memphis”. Ao final da festa, me lembro de estar na calçada quase ajoelhado, com as mãos no estômago de tanta dor, conversando com Diane e Eugene (com quem ela começara a namorar e que se tornaria nosso grande amigo). Não sei o que eles pensaram de mim, ao me verem naquele estado.
            Atualmente, estou atrás dessa fita de vídeo, que registrou o aniversário de Bibi, incluindo a apresentação da “Máfia de Memphis”. Aaron não sabe onde ela se encontra. Também não consegui a resposta dos irmãos Caleb e Burt quanto ao paradeiro (tanto deles como da fita). Uma pena! Gostaria de rever, a partir da referida fita, as emoções daquela noite e poder respirar, aliviado, ao imaginar que as crises de ansiedade estão enterradas junto com o meu passado... Também queria ter esse vídeo como um registro de Jenny e da época em que eu a amei verdadeiramente...


            Domingo, a turma da minha temporada atual (eu, Cyrinda, Carl, Bibi, Eugene e Diane) nos reunimos para assistir ao filme “Tropa de Elite 2”. Duas primas de Cyrinda, muito legais, também estavam com a gente. Foi um encontro muito divertido... Aliás, todos os nossos passeios no “Alameda” são bons, aquele lugar possuí uma atmosfera mágica para mim. E foi inevitável, para todos, a lembrança das “Noites de Terror do Playcenter”, já que o “Alameda” estava todo decorado com monstros e cenários de filmes de terror. Aproveitamos para registrar belas fotos... Inclusive, boa parte dos fatos narrados no conteúdo desse livro estão “eternizados” nas fotos.
            Na noite de terça para quarta, vivenciei um sonho bastante promissor. Uma garota bastante sensual estava sentada juntamente com a minha família, ao redor da mesa. Eu não sei dizer quem era a referida garota, talvez nunca tenha visto ela na vida. Enfim, com certeza era apenas mais uma amiga do mundo espiritual. Numa certa altura da conversa, ela me pergunta: “Billy, onde fica o Vale da Colina?”. Fiquei emocionado! Era a primeira vez que alguém (tirando Dezones) me perguntava algo a respeito de um dos meus poemas (no caso, a garota se referia ao poema “1993”)... Só não entendo o porquê de não ter respondido, para a misteriosa garota, onde realmente ficava o Vale da Colina... Sonhos são muito estranhos... Assim, aproveitarei para responder toda a verdade agora e, quem sabe, Angel (nome que estou dando para a garota misteriosa) possa captar toda a minha mensagem da Terra para o seu plano espiritual (se é que já não captou).
            Nos primeiros rascunhos do poema “1993”, chamei o lugar de “Vale das Freiras”, mas acabei mudando para “Vale da Colina”, já que o último soava muito mais romântico. Nas noites sombrias de 1993, quando eu, Adam Ball e Walter andávamos de bicicleta, sempre parávamos para descansar em frente a uma chácara pertencente às Irmãs (localizada no bairro chamado de “Jardim Pagani”). O lugar era alto como uma colina, e por isso apelidei o lugar de “Vale da Colina”. Os referidos passeios de bicicleta são relatados nos versos “Eu ando sobre duas rodas/ E sempre paro no Vale da Colina/ Para a minha vida esquecer...”. Percebe-se que o poema vai muito além de citar, apenas, os passeios noturnos de 1993: toda a carga dramática, pertencente ao ano, está presente em seu conteúdo.
            Os versos “Eu olho para você /E lamento tanto/Não poder sua receptividade corresponder...” e “Mas, por favor, continue tomando a iniciativa.../ E se eu tiver que permanecer no triste Vale da Colina/ Que pelo menos seja na sua companhia...” falam sobre o meu amor por Vicky e da minha timidez, pelo fato de não conseguir me declarar para ela. Os versos “Um solitário a caminhar pela cidade antiga,/ Desacreditando na minha própria sina,/ Imaginando o dia em que eu terei você...” e “Tratado como um nada pelos próprios amigos,/ Odiado sem motivo pelos inimigos,/ E negando os braços que você está a me oferecer...” também são sobre Vicky, mas aplicados em outro contexto, referente à solidão e à incompreensão. O poema termina com os versos “No entanto, se você pudesse olhar ao seu redor/ E sentir a brisa dos amantes/ (a qual, nesse momento, tanto me fascina),/ Com certeza, seríamos o casal mais perfeito dessa vida.”, que tratam sobre a minha vontade de passar o resto dos meus dias casado, tendo Vicky como minha esposa.
            Por fim, eis aqui a explicação para o verso mais misterioso do poema, o qual pouca gente conseguirá interpretar de maneira correta: “Comparando garotas com consoles,/ Mas amando as mesmas verdadeiramente/ (Um orgulho que só os esnobes sentem).”. O que significa isso? Bom, na verdade, era uma brincadeira machista e idiota que eu e Walter fazíamos entre nós, quando víamos uma garota (comparando a mesma com um console ou videogame). Se a garota era “linda de morrer”, falávamos que ela era um “Super Nintendo” (dos videogames mais populares, era o melhor da época). Se a garota fosse bonita (mas, ainda assim, não fosse tão perfeita), classificávamos a mesma como sendo um “Mega Drive”. Caso a garota fosse “mais ou menos”, nem tão feia e nem tão bonita, era considerada um “Nintendo 8 bits”. Bom, a partir dessas considerações, não preciso nem dizer nada a respeito de uma garota classificada como um “Atari”, não é mesmo? Antes que alguém me xingue: quando digo, no poema, a frase “(Um orgulho que só os esnobes sentem)”, estou desaprovando totalmente estas ideias machistas, referentes às aparências (aliás, odeio críticas feitas ao aspecto físico das pessoas, como comprovei em capítulos anteriores). Mesmo na época, tanto eu como Walter éramos muito românticos e, no fundo, tenho a plena convicção que não fazíamos essa brincadeira por maldade (na verdade, era um orgulho imbecil da nossa parte, coisa de garotos, só para “aparecer”, e hoje em dia desaprovo “ferozmente” essa atitude). E, de qualquer forma, lembro de nunca termos classificado nenhuma garota como “Atari. Afinal, tínhamos a consciência de que, caso entrássemos na classificação, como certeza seríamos menos que um “Atari”: Walter seria um “Tele jogo” e eu seria um “Mini game”.
            Bom, essa é a explicação definitiva sobre o poema “1993”. Espero que Angel tenha gostado e que venha me visitar mais vezes, durante o meu sono.
            Agora, vamos à explicação para a pergunta: por que apenas Dezones e Angel se interessam pelos significados dos meus poemas? E por que mais ninguém se interessa? Falta de consideração? Eu achava que era essa a resposta mais racional, porém Dezones, certa vez, acabou me explicando o que, na verdade, realmente acontece: tudo não passa de uma questão de empatia. Ou seja, a capacidade de identificação total com a outra pessoa.
            Acredito que o meu “grau de empatia”, em relação a maioria dos meus amigos, varia entre 10% e 50%. Veja bem, “grau de empatia” não tem nada a ver com “grau de amizade”. Por exemplo: acredito que o meu “grau de empatia” com John seja de apenas 40%. No entanto, o meu “grau de amizade” com ele é de 100% (assim como o “grau de amizade” que tenho com todos os meus outros amigos). Na verdade, o fato de não concordarmos em tudo e não termos a mesma visão de mundo é que acabou gerando estes 40%, apenas. E essa baixa porcentagem não impede, de maneira nenhuma, o fato de sermos os melhores amigos do mundo. John, por sua vez, certamente deve ter algum amigo que apresente, com ele, um “grau de empatia” muito maior do que o “grau de empatia” que ele possui em relação a mim. No caso de Dezones, o seu grau de empatia comigo atinge, brincando, a marca dos 70%. Por isso ele consegue compreender e se interessar por quase todos os meus poemas e músicas, da mesma maneira que consigo compreender e me interessar pelos trabalhos dele também.
            Em outro contexto, o curioso é que, em várias ocasiões, tive algum tipo de idéia que considerei genial e Dezones conseguiu provar que a minha idéia estava errada. Mesmo assim, não fiquei chateado com isso: fiquei até contente dele conseguir provar o contrário e me convencer da sua opinião. Por exemplo, esqueçam a frase que coloquei no primeiro capítulo deste livro, onde digo “Ah, antes que eu me esqueça: e o que pensar das pobres pessoas que não tem nem o que comer e nem onde morar? Será que não estamos chorando de barriga cheia? Será que toda a nossa lamentação tem sentido? Pensemos nisso antes de nos entregar à Depressão”. Quando apresentei essa idéia para Dezones, ele, categoricamente, me explicou que tudo nessa vida é relativo e, muitas vezes, existem pessoas que estão muito bem preparadas para passar fome ou ficar sem moradia (ao contrário de nós, que não estamos nem um pouco preparadas para “tomar um fora” de uma menina, por exemplo).
            No entanto, por várias vezes, tivemos a mesma conclusão sobre determinada ideia. Por exemplo, em relação àquela pergunta que enlouquece os padres, pastores e catequistas: “Se Deus criou o mundo, quem criou Deus?”. Por incrível que pareça, conseguimos achar uma resposta racional para esse grande mistério. Vamos partir de um exemplo simples: é uma verdade óbvia que a cadeira, na qual eu estou sentado nesse momento, existe. E por que ela existe? Ela existe porque alguém a construiu, ou seja, ela nunca poderia existir “do nada”. “Ah, mas ela foi feita de maneira industrial, utilizando máquinas!”. Tudo bem, mas existiu um criador para construir as referidas máquinas que, por sua vez, confeccionaram as cadeiras, certo? Ou seja, para cada “criatura”, obrigatoriamente deve existir um criador (isso é uma lógica inquestionável). No entanto, pode ser que essa lógica “criatura-criador” se aplique apenas ao planeta Terra, e não ao plano divino. Em outras palavras: quem garante que, no plano divino, seja necessário existir, obrigatoriamente, um criador para cada criatura (já que essa é uma lógica pertencente ao plano terrestre)? Quem sabe, Deus e o universo acabaram surgindo do nada? A própria Bíblia diz, em “1Cor 1, 17-31,  que é inútil tentar entender a lógica terrestre, ou seja, que tudo não passa de uma tremenda loucura. Eis alguns versículos: “Por acaso, Deus não tornou louca a sabedoria deste mundo?” e “Mas Deus escolheu o que é loucura no mundo, para confundir os sábios”. Resumindo: é inútil tentar entender a lógica divina tomando como base a lógica terrestre, que consiste, na verdade, em uma tremenda loucura.


            Na quarta-feira, passei em frente à casa que pertenceu à família de meu amigo Laurence (personagem de “Jimball Bilangs” e “Cicatrizar e Recomeçar”), e constatei que a mesma estava sendo demolida. Laurence morou por lá entre o fim da década de 80 e durante boa parte da década de 90. Tenho boas lembranças da referida casa, localizada na rua Araújo Leite. Antes mesmo de Laurence mudar para lá, ele chamava eu e meu irmão Freddy para curtirmos a piscina, existente no quintal (juntamente com a sauna seca). A casa era bonita e enorme: os cômodos (quartos, salas, cozinha e banheiros) se localizavam no primeiro andar, enquanto que, no térreo, existia uma espécie de salão, onde Laurence colocou os seus computadores MSX, posteriormente. Éramos fanáticos por aqueles computadores, sendo que ainda tenho o meu “armado” no meu quarto, disponível para a utilização (conforme já citei).
            Apesar das boas lembranças (e da minha lamentação pelo fato da casa estar sendo demolida, ou seja, um lugar a menos do meu passado), lembro-me de uma ocasião onde passamos momentos de muita tensão. Foi uma das vezes em que eu e Freddy fomos convidados por Laurence pra usar a piscina, antes dele mudar. Éramos crianças e estávamos sozinhos na casa (acredito que, também, estava presente algum amigo de Laurence ou primo, não me lembro ao certo), quando a campainha tocou. Laurence foi atender e, logo em seguida, voltou correndo, com uma expressão de terror no rosto, dizendo “Fiz uma grande besteira: ouvi uma voz ‘mal-encarada’ no interfone, dizendo que era entrega de presente. Sem querer, apertei o botão do controle remoto, para abrir o portão. O cara deve estar vindo aí”. Nem questionamos a atitude de Laurence, pois na verdade ficamos com muito medo. Em seguida, apareceu um homem que eu não conhecia, dizendo, num tom de voz severo: “Você é bobo, Laurence? Quer dizer que você abre o portão para qualquer vagabundo oferecendo presente? Quer ser assaltado?”. “Ah, tio, é o senhor! Que alívio”, Laurence respondeu algo do tipo. Ou seja, era apenas um parente querendo testar a esperteza de Laurence e evitar que algo de ruim acontecesse no futuro. Foi mesmo um alívio, e acredito que Laurence aprendeu a lição (assim como eu e Freddy também aprendemos): nunca abra a porta para estranhos.


1993 (De: Alê Braz Gardiolo)

Escrita em 05 de junho de 2010

Eu olho para você
E lamento tanto
Não poder sua receptividade corresponder...

Eu ando sobre duas rodas
E sempre paro no Vale da Colina
Para a minha vida esquecer...

Um solitário a caminhar pela cidade antiga,
Desacreditando na minha própria sina,
Imaginando o dia em que eu terei você...

Tratado como um nada pelos próprios amigos,
Odiado sem motivo pelos inimigos,
E negando os braços que você está a me oferecer...

Mas, por favor, continue tomando a iniciativa...
E se eu tiver que permanecer no triste Vale da Colina
Que pelo menos seja na sua companhia...

Comparando garotas com consoles,
Mas amando as mesmas verdadeiramente
(Um orgulho que só os esnobes sentem).

No entanto, se você pudesse olhar ao seu redor
E sentir a brisa dos amantes
(a qual, nesse momento, tanto me fascina),
Com certeza, seríamos o casal mais perfeito dessa vida.