Livro: "A Era
do ‘Make in Touch' – Os anos Unesp sem censura"
Capítulo 24 - E nessa
altura eu pensei "...acho que não curto Design tanto assim..."
No final de 2007, comecei, de forma
modesta, a utilizar o computador para produzir meu próprio som. De início, foi
mais uma brincadeira para com meu amigo Dias, feita com a ajuda do pessoal do
meu serviço (empresa de autopeças). Ele gostava de garotas mais novas, então o
pessoal resolveu compor uma música e eu fiquei encarregado de gravar. Apesar de
toda a precariedade da qualidade de gravação, achei que o resultado ficou bem
satisfatório, sendo a minha primeira incursão nessa área de “estúdio caseiro” e,
também, levando em consideração a falta de equipamentos para gravação. Eu não
tinha nem placa de som decente, nem microfones específicos, somente os
instrumentos (guitarra, baixo, violão, gaita, teclado e bateria). Porém, fiquei
surpreso comigo mesmo em poder tocar ou, melhor dizendo, poder me virar com
instrumentos os quais eu não tinha muita familiaridade (sei tocar apenas
guitarra). Assim, na sequência, resolvi gravar uma outra música, composta por meu
amigo Jim em 1995, chamada “Marcomen Tira”, que fala de um personagem que só sabia mentir
(história verídica, inclusive). A
qualidade da gravação ficou similar à música “do Dias” e resolvi mostrar, com
bastante receio, aos meus amigos de faculdade (Abraham e Reynold) que, para
minha surpresa, acharam muito legal a minha “empreitada” (a qual eu fiz por
brincadeira, sem pensar em nada mais sério). Não que a gravação fosse grande
coisa (e não era, conforme relatei), mas sim pelo fato de apenas uma pessoa
estar tocando todos os instrumentos em uma canção (Marky e John, que também
acharam interessante o trabalho, disseram que eu era “a banda de um homem só”).
A partir daí, comecei a pensar mais sério nesse assunto: quem sabe, eu poderia
investir em equipamentos mais profissionais e fazer algumas gravações mais
“caprichadas”, com músicas mais sérias?
Antes de prosseguir, eu gostaria de
explicar como era o meu procedimento nessa etapa inicial ou, em outras
palavras, como eu fiz para gravar a música “Marcomen Tira” e a música “do Dias”.
Primeiramente, eu gravava a bateria com o auxílio de um WalkMan (sim, aquele
aparelho que tocava fitas cassete), ou seja, ficava todas as partes da bateria
(bumbo, caixa, pratos, etc) gravadas juntas, em um “canal” só (no caso, a fita
cassete). Nunca fui muito bom na “batera”, por isso eu gravava apenas as partes
principais, para poder montar a bateria inteira posteriormente, por meio de
“loops. Em seguida, transferia o conteúdo do Walkman para o computador e,
cortando um pedaço da bateria aqui, outro ali e mais outro acolá (utilizando um
programa de som específico), em algumas horas eu tinha uma faixa de bateria
completa. Assim, a bateria ficava pronta para adicionar o restante dos
instrumentos: eu gravava o vocal, guitarra e baixo, cada um em uma pista
separada. Posteriormente, utilizava alguns programas para tratar o som e
colocar os efeitos (reverb, por exemplo). E, finalmente, para a minha alegria,
tinha a canção pronta, gravada de maneira “artesanal”, toda “montada” e
“planejada” dentro do meu próprio quarto. Mesmo que não ficasse uma gravação
perfeita (e realmente não ficou) e, também, levando em consideração as
circunstâncias em que o trabalho foi realizado (sem estúdio, sem equipamentos, sem
experiência, enfim, “sem nada”), eu esperava que as pessoas, no mínimo,
achassem um “esforço louvável” de minha parte ter realizado o referido trabalho
de gravação de uma faixa própria. Infelizmente, não foi exatamente isso que
aconteceu: recebi várias críticas pelo fato da gravação não ter qualidade
perfeita e, principalmente, por eu ter usado muito “eco” na gravação. Quanto à
esta última informação, é nítido perceber que a crítica quanto ao “eco” foi
dada por pessoas inexperientes e pedantes, pois nunca usei “eco” nas minhas
gravações, e sim o efeito de “reverb”, uma espécie de “ambiência” do som (que simula
lugares maiores e espaçosos). Cabe ainda mais uma informação: muitas gravações
dos anos 50 (Elvis Presley, por exemplo) utilizaram o “reverb” de maneira
exagerada e eu sempre gostei disso. Seria necessário mais pesquisa na área
musical e menos pedantismo dos críticos, ou seja, antes de criticar, verificar
a fonte na qual eu estava me inspirando para gravar as minha músicas. Agora, se
a pessoa não gosta de “reverb” e desse tipo de gravação rústica dos anos 50,
isso já não é problema meu. Digo categoricamente que o meu som estava
totalmente condizente com a minha fonte de inspiração. E “fim de papo”...
Mas, na época, eu não tive as
referidas percepções (de gravar do jeito que eu gosto e “dane-se” os outros), o
que, a princípio, foi algo bom, pois, a partir das duras críticas, eu resolvi
me especializar no assunto e investir em equipamentos mais profissionais (como
eu já planejava). E consegui obter uma qualidade de som muito superior, além de
vários conhecimentos a respeito de acústica, gravação e tratamento de som.
Deixei de lado as gravações tipo “anos 50” e “maneirei no reverb”, o que foi
legal para produzir um som estilo “punk anos 70”. Mas, por incrível que pareça,
as críticas (as mesmas críticas que atingiram a minha primeira fase de
produção) continuaram ainda mais cruéis. Comecei a pensar que poderia ser inveja
do pessoal, já que eu era a única pessoa (quem sabe, de toda a Unesp) a
realizar aquele tipo de trabalho (de gravar apenas instrumentos reais). Mas, no
final das contas, observei que era uma questão de pedantismo mesmo, pois as
pessoas que conheciam (e amavam a música como eu) eram as que mais me elogiavam
e faziam críticas construtivas (que muito me ajudaram a melhorar a qualidade
das minhas músicas).
Comecei a trabalhar, a partir de
então, para agradar a mim mesmo e as pessoas que realmente gostavam de música,
gravando tudo do jeito que eu achava mais convincente. No entanto, foi nessa
altura que eu pensei "...acho que não curto Design tanto assim...". Sempre
cito o seguinte pensamento: quando você começa a faculdade e já se estabelece
como um “designer poderoso”, tudo o que você fizer agradará as pessoas (a
capacidade de “transformar qualquer coisa em ouro”, não importa o que você
faça, por pior que seja). Não foi o meu caso, pois eu entrei na universidade
para aprender: se eu já soubesse de tudo, qual seria o sentido de estudar? O
inconveniente é que você nunca tem uma chance de provar que você aprendeu e,
quando um trabalho de sua parte fica bom, pensam “foi um golpe de sorte”. É
claro que não posso generalizar e dizer que as coisas sempre acontecem dessa
exata maneira, mas é fato que muitos trabalhos bons, no decorrer do curso,
foram menosprezados pelo fato dos mesmos não terem sido realizados por um “bom
designer” e sim por “alunos de design”. Minhas canções próprias (e boas, onde se
escuta perfeitamente o contrabaixo, a guitarra, o vocal, a bateria, enfim, todos
os arranjos e instrumentos) se encaixam neste perfil.
Para terminar, quanto à história do
“eco” (na verdade, do reverb), há pouco tempo atrás tive o privilégio de
escutar o primeiro disco da banda “Jesus and Mary Chain”, de 1985, intitulado “Psychocandy” e, percebendo o exagero na utilização do
reverb (e também na distorção), pude concluir que eu não estava tão errado assim
em relação à gravação de minhas canções: o disco é uma obra prima (sujo e ao
mesmo tempo melódico), justamente por causa do referido exagero no uso do
reverb.