terça-feira, 11 de novembro de 2014

Capítulo 28 – O colhedor de algodão - Livro: "A Era do ‘Make in Touch' – Os anos Unesp sem censura"

Livro: "A Era do ‘Make in Touch' – Os anos Unesp sem censura"

Capítulo 28 – O colhedor de algodão



            Por uns tempos, antes mesmo da formatura, eu senti na pele que o mercado de trabalho em Bauru estava muito concorrido, com poucas vagas. Inúmeros processos seletivos acabei fazendo, mas a concorrência era enorme (inclusive, boa parte dos concorrentes eram colegas meus de faculdade). Não consegui nenhuma vaga nos referidos processos e, por causa disso, decidi manter as aulas particulares de informática, as quais comecei a ministrar na própria Unesp em tempos anteriores.
            Apesar de conseguir vários alunos e ganhar dinheiro suficiente para me manter, o período das aulas particulares foi um tempo de muito sacrifício, de muita economia, de inúmeras caminhadas debaixo do sol (para economizar gasolina do carro). Por outro lado, foi uma época em que adquiri muito conhecimento da própria vida e também pude aprender várias coisas com meus alunos (pessoas maravilhosas, diga-se de passagem). Além disso, nessa época, pude voltar a estudar desenho de observação na escola recém fundada pelo meu amigo John e fazer alguns trabalhos “freelance” como designer recém formado.
            O problema mais sério em trabalhar por conta própria é que, muitas vezes, não ocorre aquela constância em se manter a clientela (ou os alunos, no meu caso). As vezes, passamos algumas semanas com uma quantidade enorme de serviços e outras semanas, pelo contrário, onde não se tem nada para fazer. Assim, decidi que precisava arranjar um emprego fixo, assalariado, de preferência que o trabalho fosse realizado em meio período (dessa forma, não precisaria abandonar as aulas de informática).
            Lembrei-me de uma passagem do livro de Jack Kerouac, o “On the Road”, onde o próprio Jack, para conseguir ganhar dinheiro para continuar suas viagens, aceitou um emprego de colhedor de algodão (trabalho que o mesmo jamais havia realizado). Kerouac ainda não era famoso, mas já era um escritor (inclusive, já havia publicado o livro “Cidade pequena, cidade grande”).  Decidi partir pelo mesmo princípio: poderia tranquilamente aceitar um emprego em outra área que não fosse Design. Afinal, já havia passado por tantas ocupações (como mencionei no capítulo anterior) que o senso de adaptação já estava totalmente impregnado em mim. Recordei, também, da época em que trabalhei como estoquista de autopeças, ocupação a qual eu não tinha nenhuma experiência e que pude, com o tempo, aprender a desenvolver a mesma com maestria.
            Não me tornei exatamente um “colhedor de algodão”, mas concluí que um trabalho como “operador de cobrança” seria um bom desafio e uma ótima maneira de aprender a negociar. Afinal, eu não tinha experiência nenhuma em negociar com meus clientes (e também com meus alunos). Assim, a ideia foi trabalhar no período da tarde na assessoria de cobrança e, de manhã, continuar a ministrar as minhas aulas de informática. Assim, deixei meu currículo na assessoria MC e, pouco tempo depois, fui chamado para a entrevista.
            A entrevista foi marcada no período da manhã, em uma sala enorme, repleta de candidatos (uma quantidade muito maior de candidatos que os processos seletivos de Design). Fiquei um pouco inseguro, pois sabia que, provavelmente, pelo menos metade do pessoal que estava na sala seria reprovado. Fiz a entrevista com a psicóloga e ela me disse que, caso eu não recebesse nenhuma ligação até o dia seguinte, era porque eu não havia “passado” na entrevista. No dia seguinte, felizmente, acabaram me ligando.
            Pensei que a minha vaga estava garantida, mas não foi exatamente o que aconteceu. Antes do ingresso a qualquer emprego, é necessário alguns exames médicos preliminares. E acabei não passando na audiometria, o teste de audição. Os meus estudos com som e produção de músicas da época da faculdade, os quais me dediquei com afinco, comprometeram minha audição. A minha paixão por “sound design” se tornou motivo da minha derrota. A fonoaudióloga disse que nem tudo estava perdido, visto que eu poderia fazer ainda uma limpeza de ouvido com um médico particular. Assim procedi e nenhuma espécie de sujeira, no meu ouvido, foi detectada pelo médico. O mesmo indicou que o próximo passo seria fazer uma nova audiometria (particular) e, para a minha felicidade, dessa vez eu “passei” na mesma.  Em seu laudo, o médico deixou claro que realmente eu tinha uma perda auditiva, mas que era tão pequena que não atrapalharia o meu trabalho como “operador de cobrança”. Não passei na primeira audiometria, provavelmente, pelo fato de estar nervoso ou por algum problema de saúde (rinite ou sinusite). Levei os exames realizados para a Assessoria e fui chamado, dias depois, para fazer o treinamento. Estava muito feliz por poder voltar a trabalhar, mas um pouco triste pelo fato de não ter mais coragem de mexer com produção de músicas, com medo de prejudicar mais a minha audição.
            Antes de começar a trabalhar, participei de um treinamento de duas semanas, onde tive oportunidade de conhecer várias pessoas maravilhosas como, por exemplo, o Sam (que praticamente possui os mesmos gostos musicais que eu, além de gostar de literatura também). Depois do período de treinamento, finalmente fui para a operação de cobrança, onde estou até os dias de hoje.

            Comecei a escrever o presente livro em meados de junho de 2011, sem imaginar o que escreveria no último capítulo (finalizado em novembro de 2014). Seria interessante se cada personagem que participou da história pudesse também escrever o seu próprio livro, a partir do seu próprio ponto de vista. Tenho certeza que iria render relatos muito interessantes. Quanto a mim, fico por aqui, feliz de ter terminado o livro dos anos Unesp e sonhando com o dia em que, de alguma maneira mágica, esses bons tempos possam voltar.

FIM

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