Capítulo
3 – Bota ortopédica na canela dos Bullies
Existia uma época em que eu atraía
multidões. Não, confesso que estou exagerando um pouco (falar de multidões é falar
de gente “pra caramba”). Na verdade, eu atraía uma boa quantidade de pessoas
quando eu armava algum “rolê”. Já não posso dizer o mesmo hoje em dia. É, os
tempos mudaram! Mas isso é apenas um desabafo, não tem nada a ver com o
presente capítulo. Pretendo falar disso mais para frente, talvez. Bom, vamos ao
assunto principal então.
A segunda garota por quem me apaixonei
foi uma francesinha chamada Desiree. Isso foi depois de mais ou menos dois anos
em que eu havia me apaixonado pela primeira, que foi Naomi, a minha amiga
oriental. Sim, minhas primeiras paixões foram uma japonesa e uma francesa! Dá
para acreditar?
Desiree era muito bonita e delicada,
assim como Naomi. Me apaixonei por ela depois de um sonho que tive à noite
(sim, da mesma maneira como foi com Naomi). Deixo claro, mais uma vez, que o
sonho não teve nada de tão espetacular, ou seja, não teve nenhuma “sacanagem”,
como os mais safados devem estar pensando. Nem lembro do referido sonho. Aliás,
preciso dizer uma coisa para vocês. Uma coisa pela qual já fui tachado de bobo quando
relatei a mesma. É o seguinte: não adianta, por mais que as pessoas evitem
falar no assunto, todos tem ou já tiveram alguma fantasia relacionada ao amor
(sim, aqui estou falando das mais fantasias mais picantes). Mas, no meu caso,
tem um pequeno detalhe: eu não consigo pensar em um tipo de fantasia sexual
mais picante com garotas que eu amei verdadeiramente. Podem me xingar, mas
estou falando a verdade! Eu só consigo enxergar as garotas que eu amei de uma
maneira mais romântica, ou seja, em um tipo de fantasia que seja um pouco mais
saudável (ou seja, não consigo pensar em sacanagens mais explícitas com garotas
amadas). Sim, pode ser que eu não seja desse mundo, como muitos devem estar
pensando agora (até mesmo já pensei nessa possibilidade). Mas, pelo menos, ninguém
pode dizer que eu não seja um cara sincero. E, também, o que eu tenho a perder relatando
essas coisas? Não dizem que, numa relação, os homens fazem simplesmente sexo e
as mulheres, corretamente, fazem amor? Se concordo com o ponto de vista das
mulheres, nesse sentido, então estou no caminho certo, com certeza.
Bom, voltando ao meu amor por Desiree,
não posso dizer que teve aquela leveza, aquela espontaneidade, aquela inocência
e, porque não dizer, aquela felicidade dos tempos de convivência com Naomi. E qual
o motivo dessa diferença? Simples resposta: a timidez. Enquanto eu só
considerava Desiree mais uma garota bonita da minha classe, tudo estava indo
muito bem (até chegamos a fazer um trabalho de classe juntos). Porém, a partir
do momento em que me apaixonei por ela, fiquei inseguro até mesmo de me
aproximar dela para simplesmente conversar. A beleza estonteante de Desiree me
intimidava! Por exemplo, a sua estatura majestosa era algo que me deixava
prostrado, sem ação (ela era bem mais alta que eu, diferente de Naomi, que
tinha a minha mesma estatura). Vou contar uma coisa: naquela época (1986) tinha
uma música do programa do palhaço Bozo que dizia que “quando a gente gosta de
alguém, nossa vida fica mais feliz”. Eu ouvia aquela música horrível e pensava:
“Como assim a nossa vida fica mais feliz? Quando eu amo alguém, minha vida vira
um pesadelo!”. Que “musiquinha” mais mentirosa era aquela? O Bozo estava de
brincadeira, não é? Era um tapa na minha cara ouvir aquela canção.
Mas... De onde surgiu aquela timidez
nefasta? O que aconteceu com toda aquela desenvoltura existente durante os
tempos de amizade com Naomi? Já perdi o sono pensando nisso. Mas acredito que
tudo começou no ano anterior (1985), durante os tempos de terceira série.
Aquele ano foi realmente terrível, em todos os sentidos. Mas vamos focar no
período em que realmente passei na escola, pois, se eu for contar tudo o que
aconteceu naquele ano, vou precisar de um livro inteiro para relatar tanta
história.
Eu já conhecia Jimmy desde os tempos
do pré-primário, mas não tínhamos muito contato, já que estudávamos em classe
separadas. Sinceramente, ele não parecia ser um cara desagradável. A coisa
mudou quando, finalmente, em 1985, na terceira série, passamos a estudar na
mesma classe. Por um motivo de esquecimento dos meus pais, comecei a frequentar
as aulas mais ou menos uma semana mais tarde do seu início. A classe era
bastante mista, ou seja, uma mistura de vários alunos de várias classes
diferentes (estou me referindo às classes de 1984, ou seja, da segunda série).
Achei que aquele seria um ano bastante promissor, pois fui recebido muito bem
pelos meus colegas de classe, tipo “Poxa, que legal, achávamos que você havia
mudado de escola, mas você ainda continua aqui com a gente”. Infelizmente, algo
aconteceu: Jimmy desenvolveu uma antipatia muito grande por mim, por um motivo
que até hoje não descobri o porquê. Foi um tipo de antipatia zombeteira,
principalmente pelo fato de eu ser o garoto mais baixo da turma. E Jimmy, posso
até dizer, sem exagero, conseguiu manipular a maioria dos alunos da nossa
classe no sentido de que eles também desenvolveram essa antipatia zombeteira em
relação à minha pessoa.
O Bullying que eu sofria (termo que
ninguém nem sabia da existência) era num sentido mais psicológico, mas de vez
em quando eu recebia algumas agressões físicas também (nada muito grave, mas
devo relatar que aconteciam alguns “leques na cabeça” às vezes). Porém, quanto
às agressões, uma solução surgiu: a bota ortopédica. Eu nem sei se ainda
existem nos dias de hoje, mas as referidas botas eram extremamente resistentes
e o solado era de madeira maciça, ideal para chutar a canela dos caras folgados
que vinham mexer comigo. Confesso, era uma cena linda ver aqueles brutamontes
gemendo e chorando depois de tomarem um belo “bicudo” na perna e, o melhor, saber
que eram vítimas da sua própria ignorância. Mas a felicidade acabou quando os
pais dos Bullies começaram a reclamar das pernas roxas dos seus filhos mal-educados
para a professora. Não concordei quando a professora disse que eu tinha a
intenção de machucar as pernas dos meus colegas, na verdade a minha intenção
era quebrar a perna deles. É diferente! Calma, é só uma ironia, pessoal! Até
minha mãe foi alertada para o fato, por parte da professora e, assim, fiquei
proibido de chutar os outros. Simples assim!
Atualmente, muitos reclamam da
predominância do “politicamente correto”, daquele lance de não pode dizer ou
fazer nada mais ousado sem que os outros deixem de ficar ofendidos. Isso é um
fato, mas eu tenho que admitir que, apesar de todo esse “mimimi”, as pessoas de
hoje em dia possuem muito mais bom senso do que as da década de 80. Sim, se eu
estava machucando os meus colegas com botinadas, é claro que eu deveria ser
repreendido por causa disso (sou totalmente contra a violência, a não ser no
caso de autodefesa, que justamente era o que eu estava praticando). Porém,
todavia, contudo, os meus colegas também deveriam ser proibidos de mexerem
comigo. Nada mais justo, não? Se ninguém viesse mexer comigo, eu jamais eu
teria motivo para chutar alguém. Por exemplo, um amigo meu chamado Barral era
um cara muito nervoso, mas se eu não fosse provocar ele, o mesmo jamais teria
motivo para me agredir. Mas não foi isso o que aconteceu: só proibiram os meus
chutes, ou seja, não existiu nenhuma proibição no caso do Bullying praticado
contra a minha pessoa. Eu gostava muito das professoras daquela época (uma
delas até deixou de dar aula por algum motivo misterioso que nunca descobri),
mas devo confessar que elas não tinham o mínimo bom senso de ver “os dois lados
da moeda” (eu sozinho contra os Bullies). Não preciso nem dizer que o
acontecimento foi uma glória para o meu rival Jimmy.
O engraçado era que Jimmy era um cara
muito querido e popular pelas outras pessoas, até mesmo um cara legal, de bom
coração. Seu suposto ódio era somente para comigo. Realmente, me senti muito
sozinho naquela época, pois gostaria de ter uma boa relação com as outras
pessoas, assim como Jimmy tinha. Provavelmente, toda a minha timidez e
insegurança surgiu daí. Lembro que naquele ano eu precisei fazer uma cirurgia
para extrair as amígdalas. Quando a enfermeira me pegou no colo para levar na
sala de cirurgia (pensem no meu corpinho pequeno, delicado e frágil), eu confesso
que chorei. Não só pelo fato de estar com medo da operação, mas também por
lembrar, naquele momento, dos meus colegas de classe (que supostamente não
gostavam de mim) e imaginar que, se eu morresse ali, no centro cirúrgico,
ninguém nem iria se importar.
Bom, devo ser justo com Jimmy, pois talvez ele
não me odiasse tanto assim, visto que, quando retornei às aulas após o período
de repouso médico, ele veio conversar comigo, para perguntar se eu estava bem.
Foi uma conversa amistosa e, não sei o porquê, contei a ele que eu havia
chorado a caminho da sala de cirurgia (só não falei o motivo). Jimmy disse que
eu não precisava me envergonhar por causa disso, pois ele também chorava
quando, por exemplo, tinha que tomar injeção. Se bem me lembro, após essa
conversa, as atitudes ruins de Jimmy para comigo amenizaram um pouco (não creio
que chegaram a se extinguir, mas diminuíram bem). Até que tudo culminou no dia
do meu aniversário. Era um festival no auditório do colégio, onde teve um
momento onde foram chamadas as crianças aniversariantes e, acreditem, subiram
no palco, juntos, eu e Jimmy! Sim, havíamos nascido no mesmo dia, no mesmo ano,
no mesmo hospital! Algo marcante, nessa ocasião, foi reparar no semblante
sereno de Jimmy, olhando para mim, maravilhado, como se estivesse querendo
dizer: “Billy, chegamos ao mundo no mesmo dia, cara! Isso é sensacional”.
Assim, não devemos guardar mágoa das pessoas, acho que todos merecem uma
segunda chance. Reencontrei Jimmy muitos anos mais tarde, em 1994, época em que
fizemos o cursinho pré-vestibular na mesma classe. E ele mostrou, finalmente, a
pessoa maravilhosa que ele era: educado, simpático, um verdadeiro “gentleman”.
E tinha, agora, um grande respeito por mim, que também era recíproco.
Bom,
voltando à 1986, quando conheci Desiree, devo reconhecer mais uma vez que, provavelmente,
a timidez e insegurança surgiram no referido ano por causa dos problemas do ano
anterior. É a única explicação plausível que posso dar. Mas, sabe de uma coisa?
Mesmo sofrendo por causa de Desiree (pelo fato de não conseguir me aproximar
dela), 1986, no geral, foi um ano maravilhoso! Me tornei um cara mais
introspectivo, é verdade, mas foi um fato que resultou no fim de todo e
qualquer Bullying. E, a partir daquela época, consequentemente, comecei a me
dar muito bem com meus colegas de classe, que acabaram virando meus melhores
amigos. Enfim, como sempre digo, nunca é tarde para mudar, nunca é tarde para
evoluir, nunca é tarde para amar verdadeiramente.
Nota:
Segundo a internet, o nome Desiree “...significa ‘desejada’, ‘a querida’. Desiree
é um nome francês que tem origem a partir do latim”.
Oi Alê! Sobre a falta de bom senso nos anos 80, eu acho que algumas vezes nós tentamos falar com com os adultos o que acontecia e eles simplesmente não conseguiam entender. Era falta de habilidade mesmo. Outras vezes, nós nos calávamos porque sabíamos que era inútil reclamar. De qualquer forma, talvez isso nos tenha fortalecido. Não sei o que vai ser desta geração das minhas filhas, onde são superprotegidos. Será que serão adultos frágeis ou pessoas quase sem nenhum trauma ?
ResponderExcluirUm abraço e continue escrevendo.
Oi, Camélia, tudo bom? Obrigado por acompanhar o blog.
ExcluirGostei muito da sua opinião, algo muito bem lembrado: como não tínhamos sempre uma superproteção (apesar que minha mãe às vezes exagerava na proteção dela), hoje provavelmente nos tornamos mais fortes por causa disso. Lembro que no nosso tempo de prézinho (olha que loucura), teve uma festa junina e o expediente da escola terminou mais cedo. Eu lembro que eu fiquei sozinho na rua Bandeirantes, mais ou menos uma hora e meia, esperando a perua escolar chegar. Uma criança de 6 anos, sozinha na rua, sem nenhum adulto por perto! Olha que absurdo! Kkkkk Algo desse tipo, hoje em dia, é fora de cogitação. Os tempos eram outros mesmo! Grande abraço!
Oi Alê! Sobre a falta de bom senso nos anos 80, eu acho que algumas vezes nós tentamos falar com com os adultos o que acontecia e eles simplesmente não conseguiam entender. Era falta de habilidade mesmo. Outras vezes, nós nos calávamos porque sabíamos que era inútil reclamar. De qualquer forma, talvez isso nos tenha fortalecido. Não sei o que vai ser desta geração das minhas filhas, onde são superprotegidos. Será que serão adultos frágeis ou pessoas quase sem nenhum trauma ?
ResponderExcluirUm abraço e continue escrevendo.
Oi, Camélia, tudo bom? Obrigado por acompanhar o blog.
ExcluirGostei muito da sua opinião, algo muito bem lembrado: como não tínhamos sempre uma superproteção (apesar que minha mãe às vezes exagerava na proteção dela), hoje provavelmente nos tornamos mais fortes por causa disso. Lembro que no nosso tempo de prézinho (olha que loucura), teve uma festa junina e o expediente da escola terminou mais cedo. Eu lembro que eu fiquei sozinho na rua Bandeirantes, mais ou menos uma hora e meia, esperando a perua escolar chegar. Uma criança de 6 anos, sozinha na rua, sem nenhum adulto por perto! Olha que absurdo! Kkkkk Algo desse tipo, hoje em dia, é fora de cogitação. Os tempos eram outros mesmo! Grande abraço!